sábado, 14 de novembro de 2015

CORREDOR DA MORTE

Muvuca, calor infernal. Um copo
de café voa pela janela.

- Caralho, quase caiu lá dentro...

O maluco ri enquanto o carro vermelho segue a viagem.

- É, você ia vê era se esse copo
pegasse em mim.

Resmunga um cara ao lado.

- O quê?

- Cê ia vê só era se esse copo pega em mim.

- Ah é?

- É.

- Ah é...

Quem tá em volta já dá uma olhada,
mas a viagem segue costumeira.

- E aí truta, pode vir resolver aquele negócio
aqui? Ahn? É sério. Tô falando ué...
Pode vir que a gente acerta agora.

Daí um cara com camiseta laranja acena
lá da frente.

- E aí, maluco. Já vou...

- Beleza.

A chamada é encerrada. Bocas balbuciam algo incompreensível.

- Que foi, achou ruim o que eu falei?
Quase derramou a porra do café aqui em mim. Quer resolver a gente resolve, só descer desse ônibus. Vem, vamo descer.

-Qual é maluco?

-Qual é o quê?

-Qual é maluco?! Ficou doido!
Vem falando assim não rapá!

- Achou o quê?! Vem falando um
monte de porcaria zum-zum-zum me intimidando aqui
no meio de todo mundo e quer ficar numa boa!

E daí mais uns quatro surgiram
e começaram a cobrir o resmungão de porrada.

- Ai que merda! Motorista, para
essa porra de ônibus! Abre essa porta pelo
amor de Deus! Para, para!

Gritos mais gritos. Um monte de gente passa pro fundão.
Outros tentam apartar a briga.

- Licença aí, licença aí...

Mais um entra no lance, segurando na barra
de ferro e chutando por cima.

- Achou o quê?
Se eu tivesse com uma faca na mão já
tinha te furado seu mané.

- Fica na sua. Vai entrar na briga dos outros é?

-Esse filha da puta só porque veio do Maranhão!

O resmungão - de quem a voz ficou totalmente abafada ali-
continuou levando chute e soco
enquanto pedia, quase que fervorosamente, por calma.
Foi quando o motorista brecou o ônibus e as pessoas todo aquele tumulto espremido conseguiu anestesiar o ânimo da surra.

- Porra motora, põe essa bosta
pra andar! Anda logo com isso aí!
Segue viagem! Nao aconteceu nada.

E a viagem seguiu, seguiu,
até uma barreira policial
depois da baixada.

- Esse aí é a vítima, seu polícia!
Quem teve culpa foi aquele! Aquele!
Isso, quem começou tudo foi esse!
O outro, o outro também! Esse aí
de camiseta laranja! O de mochila também! Aquele outro, do canto!

A caguetagem rolou solta...
e logo em seguida a viagem seguiu.

Por fim por mais que eu me pergunte
de quem é a culpa, quem ou o quê realmente começou com as agressões
por mais que eu procure entender o ocorrido
e ainda tire uma conclusão...
Qualquer resposta que pudesse existir ali
foi alterada minuciosamente
enquanto os passageiros como que de volta a um paraíso
acomodados em seus lugares
assistiam pela janela
toda aquela turma entrar em cana.


Ivan Silva, Fevereiro de 2015

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

JANELA ABERTA

por Marielle Sant'Ana


Estavam ainda frescas as tintas na parede do universo. Foi, naquele instante, que nasceu uma estrela de brilho milenar. Aquecendo mundos frios e distantes, esquecendo o próprio medo do escuro. Queimou-se até o último suspiro. Ficou, naquele espaço, uma grande massa branca de ausência escrita. Abriu-se, assim, uma janela para outro plano. 

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